Fonte: Huffpost Brasil
A cada 40 segundos uma pessoa morre por suicídio no mundo, de acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde). E falar em suicídio não é falar sobre algo pesado, mas chamar atenção para uma questão de saúde pública.
Pensando nisso, desde 2015, o mês de setembro é dedicado à prevenção e a construção de medidas saudáveis para discutir o tema — deixando de lado qualquer tipo de preconceito.
A partir deste domingo (1º), apresentaremos a campanha SetembroAmarelo do Brasil, uma inciativa do Centro de Valorização da Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
De acordo com dados da OMS, cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio a cada ano. A “violência autodirigida” é classificada pela OMS como a 14ª maior causa de morte.
No entanto, a própria organização reconhece que um dos grandes entraves à prevenção do suicídio é, justamente, a dificuldade de identificá-lo como uma questão de saúde pública.
Muitas vezes, o problema é estigmatizado e afasta o paciente da busca por ajuda profissional e até mesmo familiar.
Porém, muitas vezes, o suicídio é evitável, já que mais de 90% dos casos de suicídio estão associados a questões de saúde mental. Em 36% das vítimas de suicídio, existe o diagnóstico da depressão.
Muitas pessoas ainda acham que falar sobre suicídio agrava ou estimula a situação. Porém, especialistas em saúde mental discordam. Na realidade, legitimar uma conversa responsável sobre o tema pode ajudar as pessoas a buscarem a ajuda adequada.
E tudo começa por construir um espaço sem julgamentos em que o tema possa ser falado.
“Conversar abertamente sobre suicídio é importantíssimo e pode ajudar muito aqueles que estão em grande sofrimento psíquico e vendo a morte como uma alternativa para dar um basta ao seu sofrimento”, explica ao HuffPost Brasil a psicanalista Soraya Carvalho.
“O ideal é que a pessoa seja escutada por um profissional especialista no assunto ou por voluntários do CVV, que recebem treinamento para abordar pessoas em risco de suicídio. Entretanto, a família, um amigo ou um professor podem ajudar muito sem que tenham um preparo especial para lidar com tal assunto, desde que sigam algumas recomendações básicas e fundamentais”, completa.
Há uma diferença, no entanto, que precisa ser pontuada. Pensar sobre a morte é algo mais comum. Todo mundo já se viu em uma situação em que imaginou o fim da vida. No entanto, a ideação do suicídio é algo mais grave. Ela surge no momento em que a pessoa pensa que não há mais qualquer valor em se manter vivo.
As pessoas sentem que a dor e o sofrimento são impossíveis de ser superados, insuportáveis e intermináveis. Sozinhas, elas não conseguem perceber que podem ter ajuda e que, muitas vezes, está acontecendo na cabeça delas uma distorção da realidade vivida.
A OMS já deu o alerta: o suicídio é a segunda causa de morte entre jovens.
No Brasil, a média de suicídio entre pessoas dos 15 aos 29 anos é de 5,6 mortes a cada 100 mil jovens — 20% acima da média mundial, segundo as pesquisas pesquisa Violência Letal contra as Crianças e Adolescentes do Brasil e Mapa da Violência: os Jovens do Brasil.
Fator importante nessa equação, o Brasil é também o país com a maior prevalência de depressão da América Latina. A doença afeta 5,8% da população e os números elevados também acompanham a escalada do suicídio no País.
Na contramão do resto do mundo, a taxa de suicídio entre adolescentes de 10 a 19 anos aumentou 24% entre 2006 e 2015. Hoje, é a quarta maior causa de morte entre os jovens brasileiros, de acordo com o Ministério da Saúde.
Assim como na ficção, como foi ilustrada pela série 13 Reasons Why, produção da Netflix, muitos adolescentes estão pedindo ajuda.
Os pais, familiares, amigos, colegas e professores enfrentam uma busca por conseguir identificar essas mensagens, que muitas vezes chegam codificadas e mal se traduzem em palavras.
Segundo a pesquisa Depressão, suicídio e tabu no Brasil: um novo olhar sobre a Saúde Mental, realizada pelo Ibope Conecta, os jovens brasileiros sabem pouco sobre a depressão, sentem vergonha de falar sobre o assunto e não estão convencidos sobre a importância do tratamento.
Para 26% dos entrevistados de 18 a 24 anos a depressão é uma “doença da alma” e quase um terço deles (29%) não acredita que a depressão é uma doença que possa ser tratada.
Quando se analisa um grupo ainda mais jovem, dos 13 ao 17 anos, a situação também preocupa. Para 23% deles, não existem sintomas físicos na depressão, porque ela não seria uma doença, mas “apenas um momento de tristeza”.
A adolescência e o início da vida adulta são períodos complexos. E quando falamos em suicídio e transtornos de humor, isso inclui aspectos fisiológicos, sociais e culturais, muitas vezes misturados às experiências de traumas ou perdas de nossas próprias vidas.
“Há, nos jovens, uma força pulsional e uma dificuldade de esperar e transformar esta força em pensamento. A impulsividade é normal no adolescente e é um dos motivos para que a maioridade penal seja a partir dos 18 anos. Os adolescentes precisam de adultos próximos, como pais e professores, que os escutem com paciência e acolhimento e os ajudem a pensar”, explica o psicanalista Roosevelt Cassorla ao HuffPost Brasil.
Para o psiquiatra Teng Chei Tung, muitas vezes, características que podem sugerir quadros depressivos e um risco aumentado para o suicídio são confundidas com estereótipos associados a uma determinada faixa etária.
“O jovem enfrenta essa pressão de ser um adulto pleno e suficiente. É um momento de transição que traz consigo questões existenciais importantes. É um grupo mais vulnerável também por enfrentar um conflito na comunicação. Muitas vezes, os jovens só conseguem construir uma ponte de apoio entre eles, e o adulto acaba se distanciando do que está acontecendo no mundo interior”, explica em entrevista ao HuffPost.
Dados sobre a depressão entre os jovens no Brasil
- 39% dos adolescentes de 13 a 17 anos afirmam não se sentir à vontade para compartilhar com a família caso recebessem um diagnóstico de depressão
- 56% dos jovens de 18 a 24 anos afirmam que não falariam sobre a depressão no trabalho ou na universidade
- 34% dos adolescentes de 13 a 17 anos dizem que não tomariam antidepressivos mesmo que o médico os prescrevesse
Fonte: Pesquisa Depressão, suicídio e tabu no Brasil: um novo olhar sobre a Saúde Mental
Mas como, então, ajudar na prevenção ao suicídio? Para a neurologista Elizabeth Bilevicius, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), o primeiro passo é posicionar a depressão como uma doença e legitimar o que o paciente sente como um sintoma que pode ser trabalhado.
″É uma forma de encorajar sua busca por ajuda, criando um entorno social mais empático e mais bem informado para ajudar as pessoas”, explica a especialista.
Se você convive com a depressão ou conhece alguém próximo, um lembrete simples pode ser o mais importante de todos: é mais importante ouvir do que falar.
Parece simples, mas o desafio de quem quer acolher uma pessoa que está mergulhada em grande sofrimento é simplesmente não fazer julgamentos prévios, baseados em ideias como “quem ameaça não se mata” e “quem quer morrer não avisa”.
Além disso, precisamos afastar as interpretações como “suicídio é um ato para chamar atenção, manipular, de fraqueza, de covardia, de coragem, de falta de fé, de Deus ou de amor” e também evitar os rótulos de que é “pessoa fraca” ou “desequilibrada”.
E lembre-se. Nunca minimize, desvalorize, compare, rotule, abandone, incentive ou desafie a pessoa que cogitou suicídio. Mas sempre busque levar a sério, escutando sem julgamento, oferecendo ajuda e acompanhando a dor do outro.
Homens: Tabu e desinformação
- 30% dos homens afirmam que depressão é “falta de fé” — entre as mulheres, o percentual é de 17%
- 55% acreditam que basta ter uma atitude positiva para superar a depressão
- 29% dos homens acham que depressão é sinal de fraqueza
Fonte: Pesquisa Depressão, suicídio e tabu no Brasil: um novo olhar sobre a Saúde Mental
Leia nossa série especial Quebrando o Silêncio em torno do Suicídio
Caso você — ou alguém que você conheça — precise de ajuda, ligue 141, para o CVV - Centro de Valorização da Vida, ou acesse o site. O atendimento é gratuito, sigiloso e não é preciso se identificar. O movimento Conte Comigo oferece informações para lidar com a depressão. No exterior, consulte o site da Associação Internacional para Prevenção do Suicídio para acessar uma base de dados com redes de apoio disponíveis.