A discussão em Plenário, na noite desta quarta-feira (5), sobre a mudança nas regras para exploração do petróleo nos campos do pré-sal foi acalorada. Vestidos com uniformes dos trabalhadores da Petrobras, parlamentares gritaram em coro “entreguistas”, se dirigindo à bancada governista. “Votar este projeto é votar contra a maior conquista do povo brasileiro”, acentuou Jandira Feghali, líder da Minoria na Câmara dos Deputados, ao encaminhar o voto “não”.
Por horas, a oposição obstruiu os trabalhos por ser contra a flexibilização da regra com o argumento de que isso abrirá caminho para a futura privatização da Petrobras e perda de arrecadação da União.
O novo regime de partilha do pré-sal foi aprovado, por 292 votos a 101, com o apoio da base de apoio ao governo Michel Temer, defensor da proposta (PL 4567/16) elaborada pelo senador José Serra (PSDB-SP). O texto retira da Petrobras a prerrogativa de operação dos blocos de exploração do petróleo. A participação da estatal estava assegurada pela Lei 12.351/10, com no mínimo 30% e na qualidade de operadora.
Na prática, o operador é quem executa, direta ou indiretamente, todas as atividades. Da avaliação e exploração, até o desenvolvimento e a produção. Em todos os consórcios de blocos licitados na área do pré-sal, a Petrobras é quem cumpria este papel.
A petrolífera atrai o olhar das multinacionais pelo baixo custo de produção. Como líder mundial em tecnologia para extração de petróleo em águas profundas, cada barril fica em torno de 8 dólares, não ultrapassando o valor total de US$ 16. Valor que não pode ser aplicado em nenhuma outra parte do mundo.
Para o líder do PCdoB na Câmara, deputado Daniel Almeida (BA), o projeto é parte de uma agenda que pretende entregar o Estado nas mãos da iniciativa privada, além de promover um desmonte da indústria nacional. “O perigo que a Petrobras corre hoje se chama Pedro Parente, que ficou conhecido no país inteiro como o ministro do Apagão! Espero que ele não produza um apagão na Petrobras”, denunciou.
O parlamentar acrescenta que o debate é sobre o setor estratégico do petróleo. “Esse é o velho discurso dos liberais para justificar a transferência da estatal para a iniciativa privada. As vozes que agora se levantam hoje para dizer que a Petrobras está quebrada são as mesmas que entregaram os setores de comunicações, elétrico”, disse Daniel Almeida.
Deputados de partidos de oposição à proposta sustentam que a estatal brasileira não passa por problemas financeiros, como apontam os deputados defensores da privatização de setores da Petrobras. O lucro da petrolífera cresceu 23% em 2015, R$ 98,6 bilhões injetados em seu caixa.
De acordo com o coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria Rangel, a Petrobras pode e deve arcar com os investimentos necessários, prevendo um retorno oriundo, por exemplo, da produção de 3,4 milhões de barris/dia até 2021. “Eles querem entregar a Petrobras com um discurso falacioso de que abrindo o pré-sal hoje, amanhã já terá dinheiro da iniciativa privada. Isso é mentira. A Câmara deveria ter a coragem de discutir como financiar a Petrobras para poder gerar empregos para o nosso povo”, afirmou.
O primeiro programa que deve ser atingido com a aprovação da medida será o Plano Nacional de Educação (PNE). Entre as metas previstas, o investimento de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) no ensino público, até 2024.
Somente com a entrega do campo de Libra, na Bacia de Campos (RJ), o Estado brasileiro deixa de arrecadar R$ 100 bilhões, sendo 41,67% destinado ao Fundo Social (perto dos R$ 50 bi). Desta reserva, estava prevista na Lei dos Royalties (12.858/13), 75% para a educação.
A quebra da Lei de Partilha dificulta a existência de programas de financiamento do ensino superior e condena ainda mais as universidades ao sucateamento, destaca a presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Moara Correia. “Aprovar a mudança do regime do pré-sal acabaria com boa parte dos recursos que seriam destinados à educação. É o desmonte da educação brasileira. Por isso, precisamos fortalecer a mobilização e impedir o avanço dessa medida que significa imenso retrocesso”, aponta.
O vice-líder da Minoria, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), ressaltou que em nenhum momento foi debatido o mérito da proposta. “Não se discutiu aqui a utilização de um patrimônio estratégico para o país, para o desenvolvimento nacional. O que se pretende é abrir mão desse patrimônio para chegar ao ponto de privatizar a Petrobras”.
Faltam ser analisados destaques ao texto, o que deve ocorrer na semana que vem.