Retirado do Geledés
Quando falamos em representatividade negra percebermos o quanto atualmente se vem falando sobre o tema, más muitas pessoas desconhecem o real significado e o efeito que trás na construção da identidade negra. Infelizmente a história da escravatura é abordada de forma a minimizar o impacto que a escravidão causou no negro “escravo”, no negro “escravo liberto” e o impacto que causa no negro “descendente de escravos”.
Por muito tempo o referencial de beleza, o referencial de padrão de indivíduo perfeito sempre foi o de um ideal branco. O que culminou em uma tentativa de branqueamento da população negra para se encaixar nesse modelo de “ideal”. Nessa tentativa podemos citar as mudanças realizadas nos cabelos (alisamentos) cirurgias para afinar o nariz como a rinoplastia e outras formas de se inserir no mundo branco. Infelizmente por muito tempo vivemos o negro no mundo branco.
Maria Lúcia da Silva, psicanalista, ressalta em seu texto racismo no Brasil: questões para Psicanalistas Brasileiros que “para muitos negros, o fato de ser negro é vivido com muita dificuldade, já que foram introjetadas imagens negativas, produzidas pelo poder discriminatório, veiculadas pelos discursos acerca do que “é” ser negro. Torna-se muito difícil conviver com um corpo tido como feio, um cabelo por definição “ruim”, os lábios denominados beiços etc. Para que o trauma da discriminação possa ser assimilado, acomodações psíquicas devem ser feitas para que a vida se torne ao menos suportável”.
Sendo assim a representatividade entra como fator importante na construção da subjetividade e na identidade negra, onde os negros começaram a conquistar espaço na mídia no meio institucional, na política, na música, filmes que vem sendo inspiração não só para às pequenas gerações, mas a todos os negros. O que traz visibilidade onde o “ser” invisível era algo que fazia parte do repertório negro. Quando refletimos acerca da invisibilidade negra e seus efeitos na infância, podemos apontar sobre a magia dos contos de fadas, dos heróis e todo universo infantil serem retratados sempre para uma população não negra. Um exemplo importante do negro no universo infantil é o saci Pererê, retratado como travesso pregador de peças, um sujeito nada confiável. E quando pesquisamos sobre, encontramos um saci onde tudo que é feito de errado é atribuído a ele.
Quantas crianças tiveram na infância a representação do saci Pererê? Hoje podemos ver a representatividade sob uma nova dinâmica e novas possibilidades. E como a construção como sujeitos livres está sempre em processo, faz se necessário contribuir com esse processo, criar e levar representatividade a população pouco representada. Pensando na fase infantil de crianças negras, idealizei uma ferramenta para contribuir na representação de ideal real, minhas “bonecas da representatividade” onde cada uma tem uma história que inspiram a autoestima e auto aceitação. No brincar a criança fantasia, cria expectativas, se constrói construindo e assim se a representação for significativa contribuí para uma construção de uma identidade mais fortalecida onde passa a ter maiores recursos de enfrentamento às violências advindas do racismo. “O que percebi desde início da criação das bonecas foi à identificação de pessoas adultas com as bonecas, a maioria relatou que passou a infância brincando com bonecas brancas ou um único modelo de boneca assim despertando o desejo de ter uma boneca negra. Ficando mais evidente o quanto a representação é importante e necessária, pois poder se ver através de um objeto tão significativo contribui para um despertar de sentimentos que vão além de ser uma simples e mera boneca”.
Prescila de Fátima Vieira Venâncio, Psicóloga Clínica, pós graduanda em psicopedagogia CRP 04/54409.